O homem sem sorte – Armênia
O homem sem sorte – Armênia
Recontado por Giliane Ingratta Góes
Vivia perto de uma aldeia um homem que era completamente sem sorte. Nada do que ele fazia dava certo. Quando ele plantava sementes o vento as levava, ou a chuva as fazia apodrecer. Aquelas que permaneciam debaixo da terra, o sol as cozinhava.
E ele se queixava com as pessoas. No início, elas o escutavam, mas, com o passar do tempo, mudavam de caminho quando o viam chegar, ou entravam em suas casas fechando portas e janelas. Então, além de sem sorte, o homem ficou muito só.
Um dia que ele refletia sobre sua vida pensou que devia existir um culpado para o que acontecia com ele. Analisou a situação de sua família. Concluiu que seu pai era um homem de sorte. Sua mãe tinha a sorte de ter casado com seu pai. E seus irmãos eram muito bem sucedidos. Pois então, se não era um caso de família, só poderia ser coisa do Criador. Pensou muito até que resolveu tomar uma atitude. Ele iria até o fim do mundo falar com o Criador que, como criador de tudo, deveria ter uma resposta.
Colocou alguns alimentos numa sacola e partiu rumo ao fim do mundo.
Andou um dia, um mês, um ano e um dia e, atravessando uma floresta, ouviu uma voz:
– Por favor, me ajude!
Ele olhou para os lados procurando alguém. Até que se deparou com um lobo, tão magro que dava para contar suas costelas. O lobo falou:
– Há três meses que estou nesta situação. Não sei o que está acontecendo comigo. Não tenho forças nem para me levantar daqui.
O homem, refeito do susto, respondeu:
– Você está se queixando à toa! Eu tive azar a vida inteira. O que são três meses? Mas faça como eu. Procure entender o porquê desta situação. Eu estou indo ver o Criador, com certeza ele saberá como resolver o meu problema.
– Se eu não tenho forças nem para ir até o rio beber água… Faça este favor para mim. Já que você está indo vê-lo, pergunte a ele o que está acontecendo comigo.
O homem, pouco disposto a ajudar, disse que se lembrasse, perguntaria.
Virando as costas, continuou seu caminho. Andou um dia, um mês, um ano e um dia e de repente, ao tropeçar numa raiz, ouviu:
– Moço, cuidado!
Estatelado no chão notou uma folhinha que vinha caindo. Levantou-se e reparou que a árvore estava num estado lamentável: suas raízes saíam do chão, sua casca estava quase solta e só tinha duas folhinhas nos galhos retorcidos. Ele falou:
– Você não tem vergonha? Olhe as árvores à sua volta e diga se você pode ser chamada de árvore? Conserte sua postura!
A árvore, com uma voz de muita dor, disse:
– Não sei o que está acontecendo comigo. Estou me sentindo tão doente! Há seis meses que minhas folhas estão caindo, e agora, como vês, só restam duas…
Ao descobrir que o homem estava indo ver o Criador, a árvore pediu que lhe perguntasse o que ela devia fazer para recobrar a saúde.
Irritado, o homem respondeu mais uma vez que, caso lembrasse, perguntaria.
Andou um dia, um mês, um ano e um dia e chegou a um vale verdejante, coberto de flores coloridas e perfumadas, às quais não deu a menor atenção. Avistou uma casa e, na frente da casa, uma moça muito bonita que estava a fiar. Pensando que ele devia estar com sede e precisando descansar, ela o convidou a entrar. Eles conversaram longamente, afinal não falavam com ninguém havia muito tempo. O homem de repente se deu conta que já era noite. Ele se levantou dizendo que não podia perder mais tempo, pois ansiava por encontrar o Criador. Ele já ia virando as costas quando ela lhe pediu um favor:
– Espere! Você que vai ver o Criador, podia perguntar uma coisa para mim? É que de vez em quando sinto um vazio no peito, que não tem motivo, nem explicação. Gostaria de saber o que é e o que posso fazer.
O homem disse que perguntaria. Retomou a caminhada e andou um dia, um mês, um ano e um dia até que, finalmente, chegou ao fim do mundo. Sentou-se e ficou esperando. Uma voz vibrante se fez ouvir. E uma voz no fim do mundo, só podia ser a voz do Criador. A voz falou:
– Tenho muitos nomes! Chamam-me também de Criador.
O homem então contou sua triste história. Ele não estava interessado em aproveitar esse encontro tão especial para saber por que depois da noite vem o dia, ou como sementes minúsculas se transformam em árvores enormes. Sua pergunta era única e única foi a resposta do criador:
– Homem, sua sorte está no mundo, basta você ficar atento para perceber o momento certo e apanhá-la!
O homem nem se lembrou de agradecer e já ia embora correndo quando a voz lhe perguntou:
-Você não está se esquecendo de nada? Não ficou de levar respostas para uma jovem, uma árvore e um lobo?
– É verdade – disse o homem – e sentou-se novamente.
Assim que ouviu do Criador as três respostas que deveria levar, o homem saiu correndo, mais rápido do que o vento.
Estava passando frente à casa da jovem, quando esta, vendo-o passar, chamou:
– Ei!!! Você conseguiu encontrar o Criador? Teve as respostas que queria?
– Sim!!! Claro! O Criador disse que minha sorte está no mundo; basta eu ficar atento para perceber o momento certo e apanhá-la!
– E quanto a mim, você conseguiu fazer minha pergunta?
– Ah! O Criador disse que o que você sente é solidão. Assim que encontrar um companheiro vai ser completamente feliz, e mais feliz ainda vai ser o seu companheiro.
A jovem então abriu um sorriso e perguntou ao homem se ele queria ser este companheiro.
– Claro que não! Já trouxe sua resposta! Não posso ficar aqui perdendo tempo com você! Não foi para isso que fiz essa jornada toda. Adeus!
E virando as costas correu, mais rápido do que a água.
Passando pela floresta onde estava a árvore, de novo tropeçou em sua raiz. Nem se lembrava dela. Enquanto a última folhinha caía a árvore perguntou se ele trazia uma resposta para o seu sofrimento.
– Tenho muita pressa e vou ser breve, pois estou indo em busca da minha sorte, e agora sei que ela está no mundo. O Criador disse que há, embaixo de suas raízes, uma caixa de ferro cheia de moedas de ouro. O ferro desta caixa está corroendo suas raízes. Você só precisa cavar e retirar esse tesouro para seu sofrimento acabar.
– Por favor! Faça isto por mim! – suplicou a árvore – Você pode ficar com o tesouro. Eu só quero de volta a minha saúde!
O homem deu um pulo e falou indignado:
– O quê?! Eu já trouxe a resposta que queria. Agora resolva o seu problema! O Criador falou que minha sorte está no mundo e eu não posso perder tempo aqui conversando com você, e muito menos sujando minhas mãos de terra.
E, virando as costas, correu, mais rápido do que a luz.
Atravessou a floresta e chegou onde estava o lobo, quase desfalecido.
O homem levou susto de novo e foi dizendo, apressadamente:
– O Criador mandou lhe falar que você não está doente. O que você tem, é fome. Vai morrer de inanição já que não consegue caçar. A não ser que passe na sua frente uma criatura estúpida o bastante e que você consiga comê-la.
Naquele momento, os olhos do lobo se encheram de um brilho estranho, e reunindo o restante de suas forças, ele deu um pulo e comeu o homem sem sorte.