O Cinturão do Brasil
Quando um cinturão de nuvens fixa-se no céu desde a Amazônia até o Sudeste, deixando-nos a todos com um grito de pavor e dor entranhado no peito, foi-me impossível não lembrar a antiga história grega sobre o Cinturão das Amazonas.
Conta o mito que este assunto surge no nono trabalho que Hércules, corajoso herói (meio humano, meio divino), que precisou realizar, por exigência da deusa Hera, doze provas dificílimas. As guerreiras amazonas eram chefiadas por Hipólita que possuía um cinturão mágico, presente de seu pai, Ares. Em uma das versões, Hércules vai em busca da realização da sua tarefa. Hipólita apaixona-se por ele e lhe oferece, gentilmente, o cinturão, sem nenhum problema. Mas, Hera incomoda-se muito, pois Hércules havia resolvido a prova com extrema facilidade a partir de uma história de amor. Ela não valorizava o Amor. Sentia-se ferida por ele e buscava uma compensação para a sua dor. Acreditava, então, na manutenção das instituições como o casamento, a qualquer custo e na ocupação de posições hierárquicas de poder. Hera disfarçou-se de amazona e infiltrou-se entre as guerreiras espalhando a notícia de que Hércules as atacaria pelas costas. Todas se enfureceram com a idéia de traição, inclusive Hipólita. Lançaram-se agressivamente sobre Hércules e seus companheiros. Eles as venceram, mas o resultado da ação de Hera, cujo coração havia substituído o Amor pelo poder, foi morte, destruição e sofrimento.
Como todas as histórias ancestrais, esta continua encerrando temas atualíssimos. O poder dissociado do Amor perde o rumo da sua finalidade de criar Vida e acaba realizando a sua sombra. A questão do cinturão que poderia ter sido resolvida de forma amena e tranqüila desaguou no horror.
Quase todos nós não temos acesso às decisões coletivas maiores, quer sejam sociais, ecológicas, econômicas ou administrativas. Mas, temos plena possibilidade de checar, a cada ação pessoal no cotidiano, o Coeficiente de Amor que nos move. “Ajo mesmo como quem sabe que o outro: seja gente, bicho, planta, pedra, água ou ar fazem parte de mim?” Mais do que nunca, no nosso tempo, cada um necessita fazer a sua parte. Esta é a questão que está colocada para a contemporaneidade. Este é o 2012. Um sábio suíço, de coração inteligente e eternamente jovem, uma vez observou que as grandes mudanças no mundo nasceram de indivíduos. Ele conhecia a alma humana.
Lygia Franklin de Oliveira
Rio, 17 de Janeiro 2011